LEI 9034/95 (ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS)

Presidência da RepúblicaCasa CivilSubchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 9.034, DE 3 DE MAIO DE 1995.

Mensagem de veto

Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:

CAPÍTULO I

Da Definição de Ação Praticada por Organizações Criminosas e dos Meios Operacionais de Investigação e Prova

Art. 1º Esta lei define e regula meios de prova e procedimentos investigatórios que versarem sobre crime resultante de ações de quadrilha ou bando.

Art. 1o Esta Lei define e regula meios de prova e procedimentos investigatórios que versem sobre ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou associações criminosas de qualquer tipo.(Redação dada pela Lei nº 10.217, de 11.4.2001)

Comentário: 1.Conceito de crime organizado: é o adotado pela Convenção de Palermo (Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, Palermo, Itália, 15/12/2000), a qual convenciona que é o "grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o fim de cometer infrações graves, com a intenção de obter benefício econômico ou moral." Bastam 3 (três) pessoas para que se configure tal organização, contrariamente à quadrilha ou bando, que exige no mínimo 4 (quatro) integrantes. O conceito de associação criminosa está contido no art. 35 da Lei 11.343/06, nos seguintes termos: "Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, "caput" e § 1º, e 34 desta Lei." 2. Distinção entre crime organizado por natureza e crime organizado por extensão: crime organizado por natureza: diz respeito à punição pelo delito de quadrilha, associação ou organização criminosa. A própria existência da quadrilha ou bando ou da associação criminosa já configura o delito. Crime organizado por extensão: diz respeito à punição pelos crimes praticados pela quadrilha, associação ou organização criminosa.3. Segundo Fernando Capez, a Lei alcança as quadrilhas ou bandos formados para a prática de contravenções penais e prática de crimes omissivos, aplicando-se neste caso, a analogia e interpretação extensiva.4. A simples ameaça de cometimento de um crime, antes de ocorrida sua execução seria suficiente, segundo Capez, para que seja dado início ao procedimento investigatório de que trata esta Lei.

Art 2º Em qualquer fase de persecução criminal que verse sobre ação praticada por organizações criminosas são permitidos, além dos já previstos na lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de provas:

Art. 2o Em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem prejuízo dos já previstos em lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de provas: (Redação dada pela Lei nº 10.217, de 11.4.2001)

I - (Vetado).

II - a ação controlada, que consiste em retardar a interdição policial do que se supõe ação praticada por organizações criminosas ou a ela vinculado, desde que mantida sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz do ponto de vista da formação de provas e fornecimento de informações; Comentário: a ação controlada independe de autorização judicial. É preciso cautela na utilização da ação controlada fundando-se na proporcionalidade e razoabilidade. A prisão dos agentes continua sendo obrigatória, tendo a autoridade policial, discricionariedade a respeito do melhor momento para efetuá-la. O fragrante continua sendo obrigatório, porém, discricionário quanto ao momento da sua realização (flagrante esperado).

III - o acesso a dados, documentos e informações fiscais, bancárias, financeiras e eleitorais.

Comentários: 1) dados fiscais e eleitorais não podem ser violados, em face da inconstitucionalidade do art. 3º, declarada pelo STF na ADIN 1570.

2) Em relação aos dados bancários e financeiros, o STF entende que o art. 3º foi revogado pela Lei Complementar 105/01, que passou a disciplinar a matéria. Quem pode quebrar sigilo de dados bancários e financeiros: a) O magistrado, conforme Lei Complementar 105/01; b) a CPI (art. 4º da LC 105/01), desde que devidamente fundamentado (CPI estadual também pode - ACO 730). Todavia a CPI não pode realizar interceptação telefônica, violar domicílio nem decretar prisão, salvo em flagrante, em face da Cláusula de reserva de jurisdição; c) em relação ao Ministério Público, prevalece no STF e STJ a corrente (2ª), segundo a qual o MP não pode quebrar o sigilo de dados diretamente, pois a LC não prevê essa possibilidade.

IV – a captação e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, óticos ou acústicos, e o seu registro e análise, mediante circunstanciada autorização judicial; (Inciso incluído pela Lei nº 10.217, de 11.4.2001)

Comentários: Interceptação é a captação da conversa entre dois ou mais interlocutores por um terceiro que esteja no mesmo local ou não em que se dá a conversa. Difere da gravação que é a captação feita pelo próprio interlocutor, e da escuta, que é a mesma captação feita por um terceiro, porém com consentimento de um dos interlocutores.

V – infiltração por agentes de polícia ou de inteligência, em tarefas de investigação, constituída pelos órgãos especializados pertinentes, mediante circunstanciada autorização judicial. (Inciso incluído pela Lei nº 10.217, de 11.4.2001)

Comentários: 1) a natureza jurídica do agente infiltrado é meio de obtenção de prova. Nesta lei e na Lei de Entorpecentes (art. 53, I), a infiltração do agente depende de autorização judicial. 2) Limites do agente infiltrado: não responde ele pelo crime de quadrilha ou organização ou associação criminosa, pois está amparado pela excludente de ilicitude e estrito cumprimento de dever legal - ou pela teoria da imputabilidade objetiva, estaria criando um risco permitido); Se porventura um homicídio for cometido pelo agente infiltrado mediante coação, será caso de inexigibilidade de conduta diversa, que é causa excludente da culpabilidade. Caso a identidade do agente infiltrado seja revelada, poderá ele fazer jus aos benefícios da Lei 9807/99, arts. 7º, 8º e 9º.

Parágrafo único. A autorização judicial será estritamente sigilosa e permanecerá nesta condição enquanto perdurar a infiltração. (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.217, de 11.4.2001)

CAPÍTULO II

Da Preservação do Sigilo Constitucional

Art. 3º Nas hipóteses do inciso III do art. 2º desta lei, ocorrendo possibilidade de violação de sigilo preservado pela Constituição ou por lei, a diligência será realizada pessoalmente pelo juiz, adotado o mais rigoroso segredo de justiça. (Vide Adin nº 1.570-2).

§ 1º Para realizar a diligência, o juiz poderá requisitar o auxílio de pessoas que, pela natureza da função ou profissão, tenham ou possam ter acesso aos objetos do sigilo.

§ 2º O juiz, pessoalmente, fará lavrar auto circunstanciado da diligência, relatando as informações colhidas oralmente e anexando cópias autênticas dos documentos que tiverem relevância probatória, podendo para esse efeito, designar uma das pessoas referidas no parágrafo anterior como escrivão ad hoc.

§ 3º O auto de diligência será conservado fora dos autos do processo, em lugar seguro, sem intervenção de cartório ou servidor, somente podendo a ele ter acesso, na presença do juiz, as partes legítimas na causa, que não poderão dele servir-se para fins estranhos à mesma, e estão sujeitas às sanções previstas pelo Código Penal em caso de divulgação.

§ 4º Os argumentos de acusação e defesa que versarem sobre a diligência serão apresentados em separado para serem anexados ao auto da diligência, que poderá servir como elemento na formação da convicção final do juiz.

§ 5º Em caso de recurso, o auto da diligência será fechado, lacrado e endereçado em separado ao juízo competente para revisão, que dele tomará conhecimento sem intervenção das secretarias e gabinetes, devendo o relator dar vistas ao Ministério Público e ao Defensor em recinto isolado, para o efeito de que a discussão e o julgamento sejam mantidos em absoluto segredo de justiça.

Comentários: QUEBRA DE SIGILO DE DADOS BANCÁRIOS, FINANCEIROS, FISCAIS E ELEITORAIS - ADIN 1570, em relação aos DADOS FISCAIS E ELEITORAIS, este artigo foi declarado INCONSTITUCIONAL pelo STF, que entendeu que o mesmo foi revogado pela Lei Complementar 105/01, que passou a disciplinar a matéria. Em relação à figura do JUIZ INQUISIDOR também, tal artigo foi declarado INCONSTITUCIONAL.

CAPÍTULO III

Das Disposições Gerais

Art. 4º Os órgãos da polícia judiciária estruturarão setores e equipes de policiais especializados no combate à ação praticada por organizações criminosas.

Art. 5º A identificação criminal de pessoas envolvidas com a ação praticada por organizações criminosas será realizada independentemente da identificação civil.

Comentário: para o STJ, este artigo foi revogado pelo art. 3º da Lei 10.054/00, a qual não previu a possibilidade de identificação criminal de pessoas envolvidas com organizações criminosas (RHC 12965).

Art. 6º Nos crimes praticados em organização criminosa, a pena será reduzida de um a dois terços, quando a colaboração espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações penais e sua autoria.

Art. 7º Não será concedida liberdade provisória, com ou sem fiança, aos agentes que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa.

Comentário: A proibição da liberdade provisória é discutível, uma vez que a CF/88 dispõe que "ningugém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança." (art. 5º, LXVI). A "lei" a que alude o dispositivo é o Código de Processo penal (Dec. Lei 3931/41), que em seu Cap. VI, art. 321 e segts. trata da Liberdade provisória com ou sem fiança.

"Art. 8° O prazo para encerramento da instrução criminal, nos processos por crime de que trata esta Lei, será de 81 (oitenta e um) dias, quando o réu estiver preso, e de 120 (cento e vinte) dias, quando solto." (Redação dada pela Lei nº 9.303, de 5.9.1996)

Comentário: pela mudança ocorrida no Processo Penal, em face da Lei 11.719/08, que alterou o procedimento comum ordinário, o prazo para encerramento da instrução pode variar entre 95 a 175 dias.

Art. 9º O réu não poderá apelar em liberdade, nos crimes previstos nesta lei.

Comentários: STF, HC 88420 (todo acusado tem direito ao duplo grau de jurisdição - art. 8º, 2, "h", da Convenção Americana de Direitos Humanos - Pacto de São José da Costa Rica). STJ, Súmula 347: "o conhecimento de recurso de apelação do réu independe de sua prisão." . Este artigo pode ser considerado tacitamente revogado pelo art. 387, Parágrafo Único, parte final do Código de Processo Penal, o qual prevê que o magistrado decidirá, ao proferir sentença condenatória, sobre a manutenção, ou se for o caso, imposição de prisão preventiva ou outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta. Ou seja, se não há o preenchimento dos requisitos objetivos para a imposição da segregação cautelar, o juiz é obrigado a conhecer da apelação do réu.

Art. 10 Os condenados por crime decorrentes de organização criminosa iniciarão o cumprimento da pena em regime fechado.

Comentário: o que o dispositivo veda não é a progressão de regime, mas que o regime inicial de cumprimento da pena seja o fechado.

Art. 11 Aplicam-se, no que não forem incompatíveis, subsidiariamente, as disposições do Código de Processo Penal.

Art. 12 Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 13 Revogam-se as disposições em contrário.

Publicado no DOU de 04/05/1995.